Grupo de empresários estruturam fundo social de apoio a micro e pequenos empresários que ganha escala ao mirar o ESG


O capital que olha para o social

Eduardo Mufarej um dos fundadores do fundo social Estímulo

Fernanda Knopfler e Eufrásio Simplício não se conhecem, mas têm muito em comum. Ambos são brasileiros, moradores de São Paulo, ex-empregados formais e agora empreendedores. Quando decidiram abrir CNPJ, ela há oito anos e ele há seis, passaram a integrar um grupo de micro e pequenos empresários que respondem por 70% dos empregos do País, segundo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). Eles fizeram jus às estatísticas. Como donos de negócios, geravam empregos em uma loja de roupas infantis, a Trend4Kids, e no restaurante Espetinhos SP, respectivamente.

Mas, em março de 2020, veio o isolamento social. Sem faturamento e com crédito negado nos bancos tradicionais, quase fecharam as portas. O curso da história dos dois mudou graças aos empresários Abílio Diniz, Eduardo Mufarej, Eugênio Mattar e Armínio Fraga. “Com a pandemia, nascia o Estímulo, um fundo social de apoio a micro e pequenos empreendedores”, disse Fábio Lesbaupin, diretor executivo do Estímulo.

Inicialmente alimentado apenas por doações, o fundo arrecadou R$ 60 milhões na primeira rodada. O volume, bem mais vultoso do que os R$ 5 milhões planejados nas primeiras discussões do projeto, aconteceu devido ao grande engajamento dos empresários, segundo Eduardo Mufarej, um dos seus idealizadores. “Muita gente aderiu ao projeto, o que permitiu montar uma organização filantrópica inovadora e sustentável”, afirmou. Passados dois anos, o recurso inicial se transformou em mais de R$ 125 milhões em apoio financeiro a 2,3 mil micros e pequenas empresas, com 75 mil pessoas impactadas direta e indiretamente. Para Fernanda Knopfler, uma das primeiras empreendedoras beneficiadas pelo fundo social, o apoio do Estímulo veio em boa hora, “Estávamos vivendo em uma sombra, em um buraco negro”, afirmou a empreendedora que viu seu caixa quase zerar com o fechamento das lojas e o fim das feiras presenciais. “Naquele momento foi como se eles falassem: você não está sozinha”, afirmou.

Após análise feita, Fernanda recebeu R$ 30 mil do Estímulo, o negócio de roupas infantis migrou 100% para o on-line e hoje é o sustento da família. O processo de empréstimo foi todo digital e não durou mais do que 4 dias do cadastro no site ao dinheiro na conta. Como fundo social, as principais características desse instrumento são agilidade, desburocratização, juro subsidiado – atualmente em 1,49% ao mês — carência de 3 meses e mais 21 meses para pagar o pagamento. Para ser elegível, a empresa tem que ter dois anos de existência formal, faturamento entre R$ 10 mil a R$ 400 mil e bom histórico de crédito. O recurso recebido é de um faturamento médio mensal. De acordo com Lesbaupin, o diretor do fundo, o apoio não é assistencialista. “O que queremos é fomentar o desenvolvimento em sistemas econômicos já existentes.”

Para que o projeto dê certo, porém, o empréstimo é só uma parte do apoio. A outra, vem em forma de capacitação dos empreendedores via mentorias com executivos que apoiam o projeto e outras orientações técnicas como financeiras e de marketing. Eurásio Simplício, que obteve R$ 75 mil já pagos, não esconde a satisfação que foi aprender com alguns dos mais relevantes empresários do País. “Quando eu conseguiria falar com Abilio Diniz, Eduardo Mufarej se não fosse com o Estímulo”, disse. Nessas conversas, segundo ele, o maior aprendizado foi como priorizar as necessidades em tempos de crise, planejar e replanejar o negócio. Na parte técnica, destaca cursos como o Sebrae como os de práticas financeiras. Como resultado, o empresário não demitiu um só funcionário e já fatura quase o mesmo de antes da crise.

Com o sucesso dos primeiros anos e menos de 5% de inadimplência, a expectativa é que em cinco anos o projeto alcance sua máxima potencialidade com R$ 640 milhões em empréstimos para 15 mil empresas. Para ganhar a escala projetada, um novo passo acaba de ser dado com o lançamento de um novo fundo ESG alavancado por meio de Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (Fidc) no modelo de blended finance. São R$ 40 milhões de doações (cota júnior) e mais R$ 15 milhões de investidores. Nessa rodada, participam empresas como empresários como Energisa, Localiza, Aram Capital e BP Investimentos. “A gente projetou o Fdic para não ganhar nem perder dinheiro na cota júnior. Vamos mantendo esse patrimônio”, afirmou Lesbaupin. Já os investidores da cota sênior ganham uma remuneração compatível com o mercado de 120% do CDI em 36 meses.

Criado para evitar o fechamento de pequenas e médias empresas durante a pandemia, o Estímulo está construindo uma jornada que mostra que com governança, apoios ao social vão muito além de assistencialismo e podem, de fato, gerar um impacto positivo para a sociedade. Como se diz por aí: é a economia, estúpido.

Este texto trata majoritariamente das ODS

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